Como é a tecnologia que ajudou a definir o homem mais rápido do mundo nas Olimpíadas
No último domingo (4), o norte-americano Noah Lyles conquistou a medalha de ouro na prova dos 100 m rasos nas Olimpíadas de Paris por uma diferença de cinco milésimos de segundo. O atleta foi de último a primeiro em cinco segundos e se consagrou na final olímpica disputada no Stade de France.
A disputa foi definida utilizando o recurso “photo finish”, com imagens congeladas que constataram a vitória de Lyles. A foto da linha de chegada apresentava uma proximidade milimétrica entre sete atletas.
Para mostrar essa distância mínima, foi utilizada a câmera Scan’O’Vision, do Swiss Timing, ramo da Omega responsável pela cronometragem das Olimpíadas. A ferramenta captura até 40 mil imagens digitais por segundo e é direcionada para 5 milímetros antes da linha de chegada. Com um nível elevado de dados, o sistema pode definir quem cruzou primeiro a linha.
“As Olimpíadas ganham em precisão. Pode parecer imperceptível, mas analisando os dados, define-se o vencedor. Em provas que os milímetros contam, esta tecnologia ajuda bastante”, afirma Cesar Ripari, líder do comitê de BI e Analytics da Abes (Associação Brasileira das Empresas de Software).
Desde 2018, a Omega tem apostado em ferramentas mais potentes. Naquele ano, a empresa introduziu sensores nas roupas de atletas de alto rendimento, que trouxeram mais informações sobre o desempenho dos esportistas com medidas sobre distância, passos, velocidade, aceleração e desaceleração.
A empresa também desenvolveu uma inteligência artificial que é capaz de produzir imagens ou vídeos 3D realistas. A tecnologia mostra, por meio de simulações, a trajetória de mergulho de nadadores, o poder de reação de tenistas a um saque, o movimento do corpo de ginastas ao fazer um giro, salto ou cair, entre outros.
Professor de Engenharia da UFRJ, Antônio Carlos Morim destaca que a iniciativa da Omega pode ser considerada inovadora por permitir acompanhar os movimentos dos atletas com precisão.
“Ela processa um grande volume de dados em tempo real e não cansa como um humano. A IA pode até sugerir melhorias aos atletas durante o próprio evento”, diz.
OLIMPÍADAS E A IA
Com foco em tecnologia, as Olimpíadas de Paris anunciaram diversas parcerias com empresas que atuam no setor de inteligências artificiais, como a Omega, Intel, Alibaba, entre outras. Em abril passado, o COI (Comitê Olímpico Internacional) anunciou a “Agenda Olímpica para a IA”.
Segundo o comitê, a iniciativa tem o propósito de liderar a implementação de inteligências artificiais no esporte.
Os princípios da Agenda Olímpica são:
- Apoiar atletas
- Garantir acesso igualitário aos benefícios da IA
- Otimizar as operações dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos com foco na sustentabilidade
- Aumentar o envolvimento com as pessoas
- Impulsionar a eficiência na gestão do COI
Entre as aplicações práticas da tecnologia no evento estão melhorar o desempenho esportivo e de arbitragem, oferecer informações e análises em tempo real, prevenir lesões e monitorar mensagens abusivas contra atletas nas redes sociais.
“Os jogos são o evento mais importante do mundo, e a IA pode trazer um catálogo completo de usos muito concretos”, afirmou Sarah Vickers, diretora do programa olímpico e paralímpico da Intel, gigante do setor de chips de computador, à época.
IA NO ESPORTE BRASILEIRO
Apesar do debate gerado pelas Olimpíadas, a relação entre IA e esportes é mais incerta no Brasil. No final de julho, o governo federal brasileiro divulgou o PBIA (Plano Brasileiro de Inteligência Artificial) com o objetivo de criar uma IA soberana no país e evitar vieses de modelos de empresas como Google e OpenAI. Além disso, uma votação pela regulamentação do setor foi adiada no Senado no começo de julho, após pressão da CNI (Confederação Nacional da Indústria).
Karen Fernandes, fisioterapeuta esportiva associada à Sonafe (Sociedade Nacional de Fisioterapia Esportiva e da Atividade Física) avalia que a IA ainda é um tabu no meio da fisioterapia. “Existe resistência. Tem gente que tem medo de ser substituída por uma inteligência artificial”, diz.
Ela afirma que utiliza a IA para estudar o movimento de seus pacientes, por trabalhar com atletas de beach tênis, triatlo e corrida. Fernandes aponta que a tecnologia facilita o cruzamento de dados.
“Adiciono [as informações] com a minha percepção e defino o que é melhor para o atleta. Às vezes, ele está com uma mecânica de corrida muito desgastante, com um ângulo de quadril que não é possível ver, e pode acabar se machucando. A IA vai me ajudar nisso, a minimizar lesões.”
Cesar Ripari, da Abes, aponta que o uso ainda é aquém daquele praticado nas Olimpíadas de Paris. “A IA já é utilizada para prevenção de lesão e melhoria de performance de atleta. Quando capturo os dados de um jogador que está correndo 90 minutos numa partida de futebol, preciso de uma tecnologia para analisar isso. A IA pode até oferecer sugestões para o atleta não se desgastar tanto”, diz.
Folha de São Paulo>