Política

Dilema da oposição em processos de erosão democrática: boicotes ou participação na farsa institucional?

As estratégias da oposição podem acelerar a autocratização (Venezuela) ou contê-la (Colômbia). Protestos violentos, sublevações militares e boicotes fortalecem os regimes, segundo Laura Gamboa, em “Resisting Backsliding” (“Resistindo ao Retrocesso”, de 2022).­

Vejamos a Colômbia. Álvaro Uribe propôs um referendo contra a corrupção e a politicagem que autorizava a criação de um Legislativo unicameral, a dissolução da Assembleia Nacional e novas eleições. O referendo não atingiu o quórum devido à campanha da oposição no Congresso e no eleitorado.

Mas Uribe foi reeleito com 2/3 dos votos (mais de 40% sobre o rival) e propôs novo referendo autorizando um terceiro mandato. A oposição mobilizou as ruas. No Congresso foram denunciadas as doações ilegais para a campanha pelo referendo. Pressionada, a Suprema Corte julgou-o inconstitucional.

Chávez recebeu indulto presidencial por suas tentativas de golpe (veja os antecedentes aqui na coluna). A Suprema Corte entendeu que o rito de seu julgamento não fora recepcionado pela Carta de 1961. Vitorioso nas urnas em 1998, convocou uma Constituinte —iniciativa vedada pela mesma Carta— que a oposição boicotou.

Em 2002, aprovou uma “lei ônibus” que previa 49 reformas. A Constituição bolivariana previa consulta pública ao eleitorado e à sociedade organizada (art. 211), o que não foi feito dada a impopularidade de Chávez.

A entidade de cúpula do empresariado (Fedecámaras) questionou a constitucionalidade da lei no Supremo Tribunal e a oposição mobilizou 1 milhão de manifestantes. A repressão causou a morte de 17 pessoas e levou setores militares a se sublevar. Foi o pretexto para o regime recrudescê-la, mobilizando coletivos armados.

O que alavancou a popularidade de Chávez foi o boom de commodities (2003-2011). Para assegurar controle absoluto do Tribunal Supremo, Chávez aumentou sua composição de 20 para 32 juízes. Maduro cassou o registro de partidos e encarcerou candidatos. A assimetria criada no país entre governo e oposição levou esta última a boicotar eleições.

Maryhen Jimenez argumenta que a capacidade da coordenação da oposição tem variado conforme o grau de repressão. Quando é baixa, como em 1999-2005, a alta fragmentação partidária incentiva os atores a buscarem estratégias individuais, criando conflitos entre líderes.

Quando é mediana —período 2006-2014—, a oposição coordena suas ações estrategicamente porque reconhece que só assim tem chance. Quando é muito alta, como sob Maduro, leva a estratégias individuais de sobrevivência física. Líderes desafiam o regime sem apoio de outros líderes (ex. Juan Guaidó).

Penso que a derrota acachapante do chavismo subverteu esta lógica. A farsa chegou ao limite.

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Folha de São Paulo

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