José Paulo Kupfer: No câmbio, ‘rabo abana o cachorro’; por isso, real perde (e ganha) mais
Esses aspectos, contudo, não explicam integralmente por que o real sofre mais do que moedas de outros emergentes. Um elemento, quase sempre esquecido nas análises, ajuda a entender os movimentos em geral mais intensos da moeda brasileira, em relação ao dólar.
Câmbio futuro
Esse elemento é o mercado de câmbio futuro na B3. Esse mercado, que negocia em reais contratos de compra e venda de dólar, é uma peculiaridade brasileira. Na prática, negocia dólares, mas em reais. Como é transacionado na moeda local, suas restrições à entrada e saída de recursos, bem como em relação a quem pode operar, são menores do que no mercado à vista.
O resultado é que os negócios no mercado futuro, diferentemente do que ocorre em outros países, são muito mais volumosos — e, portanto, mais líquidos — do que no mercado de dólar à vista. Calcula-se que o mercado de câmbio futuro é até dez vezes maior do que o mercado de câmbio à vista.
Usado por instituições financeiras e investidores — com forte presença de estrangeiros — para garantir proteção de negócios em dólar, arbitrar taxas nos mercados de derivativos e à vista ou simplesmente para especulação, o mercado futuro, por seu maior volume, porosidade e liquidez, acaba funcionando como base para a determinação da cotação à vista da moeda americana no mercado brasileiro — e não o contrário, como é na maioria dos países, em que o mercado à vista é onde se formam as cotações dos derivativos de câmbio.
Mercado peculiar
Na expressão do economista Márcio Garcia, professor titular da PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica, do Rio de Janeiro), experiente pesquisador dos mercados de moedas estrangeiras, no caso do mercado cambial brasileiro, “o rabo abana o cachorro”. Não se trata de coincidência o fato de que a B3 está entre as três maiores bolsas de derivativos de dólar do mundo, ao passo que o mercado à vista não figura nem entre os 20 maiores.
Matéria: UOL Economia