Mudança na lei da improbidade não beneficia ‘procurador do outdoor’, diz recurso do MPF
A PRR-4 (Procuradoria Regional da República da 4ª Região), em Porto Alegre, deve se manifestar dentro de 30 dias sobre o recurso que contesta a sentença favorável ao procurador da República do Paraná Diogo Castor de Mattos, alvo do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) depois de mandar instalar, em março de 2019, um outdoor pró-Lava Jato em um terreno da Avenida Rocha Pombo, no acesso de saída do Aeroporto Internacional Afonso Pena, na região de Curitiba.
O recurso é assinado pelo procurador da República Mauro Cichowski dos Santos, do Rio Grande do Sul. Entre outras coisas, ele argumenta que as mudanças na Lei da Improbidade Administrativa feitas em 2021 não beneficiam Castor de Mattos, ao contrário do que justificou a juíza substituta Thais Sampaio da Silva Machado, da 1ª Vara Federal de Curitiba, em sentença assinada em novembro de 2023, e que permitiu que ele continuasse no serviço público.
Segundo Cichowski, as condutas originalmente previstas na Lei de Improbidade Administrativa, de 1992, e que foram alteradas ou revogadas em 2021, “não deixaram de ser condutas ímprobas”. Ele afirma que elas continuam sendo “passíveis de enquadramento como violação dos deveres de honestidade, legalidade e imparcialidade”, quando considerados dispositivos da Constituição Federal e da Convenção de Mérida.
Já a juíza substituta entendeu que, para que a nova Lei de Improbidade Administrativa alcançasse Castor de Mattos, o outdoor teria que ter sido pago com recursos públicos, o que não ocorreu, já que ele justificou ter bancado com dinheiro do próprio bolso.
O outdoor custou R$ 4.100,00 e tinha a imagem de nove procuradores da Lava Jato, acompanhada do seguinte texto: “Bem-vindo a República de Curitiba – terra da Operação Lava Jato – a investigação que mudou o país. Aqui a lei se cumpre. 17 de março, cinco anos de Operação Lava Jato – O Brasil Agradece”.
Mas Cichowski também contesta o entendimento de que as alterações na Lei de Improbidade Administrativa estariam valendo para o réu. “O texto constitucional ressalva apenas no âmbito do Direito Penal a garantia da retroatividade da norma mais favorável. No âmbito do direito civil, e mesmo no administrativo sancionador, não há aplicação da retroatividade da norma benigna”, diz trecho do recurso.
O CNMP decidiu aplicar a pena de demissão a Castor de Mattos pela contratação do outdoor em sessão de julgamento realizada em 18 de outubro de 2021, antes da entrada em vigor da nova Lei da Improbidade Administrativa, em 25 de outubro de 2021.
Por 6 votos a 5, o CNMP entendeu que o procurador cometeu ato de improbidade administrativa. Mas, por causa da vitaliciedade do cargo, a pena de demissão não é aplicada de forma imediata. Após a decisão do CNMP, o então procurador-geral Augusto Aras delegou a um membro do MPF (Ministério Público Federal) a tarefa de entrar com uma ação civil pública de perda do cargo contra Castor de Mattos, o que ocorreu em julho de 2022.
A defesa de Castor de Mattos argumenta que a demissão é desproporcional ao fato e que em casos de maior gravidade, como assédio moral e enriquecimento ilícito, o CNMP teria indicado penalidades como suspensão.
A sentença da ação civil pública, a favor do réu, saiu em novembro de 2023, daí o recurso do MPF ao TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), na sequência.
O recurso de Cichowski chegou ao gabinete do desembargador federal Luiz Antonio Bonat em 19 de fevereiro de 2024 e permaneceu sem qualquer movimentação até 31 de julho, quando a reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa do TRF-4 questionando as razões.
Cerca de três horas após o contato, houve a primeira movimentação no processo, na qual o magistrado determina um prazo de 30 dias para manifestação da PRR-4 sobre o caso.
Em nota encaminhada à reportagem naquela data, o gabinete de Bonat informou que a apelação “se encontra aguardando o julgamento, que ocorrerá o mais breve possível”. Acrescentou que “cabe observar que existem, também aguardando julgamento, processos mais antigos no gabinete, dentre os quais casos urgentes, com prioridades legais e incluídos em meta” pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
Bonat atuou como juiz titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pelos processos da Lava Jato no começo da operação, logo após a saída de Sergio Moro, que deixou a cadeira para ser ministro de Jair Bolsonaro (PL), no final de 2018, e hoje é senador pelo União Brasil.
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Folha de São Paulo