Economia

O mundo vai mudar, mas para pior, diz economista Nouriel Roubini

Para Nouriel Roubini, economista que palestrou no ciclo Fronteiras do Pensamento na noite desta segunda-feira (8), o mundo vai mudar na próxima década. E, muito possivelmente, para pior.

Conhecido como “Doutor Apocalipse” por ter sido uma das vozes que alertaram para a crise financeira de 2008, o autor do livro “Mega-Ameaças” identificou dez grandes desafios que colocam em xeque o sistema político e econômico dominante pelos últimos 75 anos.

“Vivemos em uma era de hiper-incerteza. Além dos riscos econômicos e financeiros, temos de considerar os sociais, políticos, geopolíticos, ambientais e tecnológicos”, explicou o professor da Universidade de Nova York.

Roubini defendeu que o mundo passa por uma mudança de regime, e que o futuro dá todos os sinais de que será bastante diferente do passado recente.

Para o economista, um dos fatores centrais dessa transformação é a mudança do panorama econômico: se antes o mundo vivia uma era de “estagnação secular”, representada por uma tendência de baixa inflação e baixo crescimento entre as economias mais desenvolvidas, agora a realidade é de “estagflação”, onde o baixo crescimento está acompanhado de uma alta da inflação.

Os sinais, argumentou o conferencista, são visíveis no mundo pós-Covid. O aumento do preço das commodities, uma busca de diversos países pela desdolarização, a queda dos investimentos off-shore e o aprofundamento dos déficits e dívidas orçamentárias seriam fatores claros.

Mas os desafios não se limitam ao âmbito econômico. As “mega-ameaças” que se apresentam passam por quase todas as camadas da sociedade.

Do lado político, a disputa entre os Estados Unidos e seus aliados e o que Roubini chama de “bloco revisionista”, com países como China e Rússia, já se aprofunda em conflitos armados e indiretos —o que implica numa possível fragmentação do mercado mundial e um aumento de protecionismo econômico.

O que, por sua vez, se liga ao crescimento de governos autoritários de esquerda e direita, impulsionados pelo aumento da desigualdade social e econômica que radicaliza os eleitores.

O fortalecimento das pautas populistas também ajuda a explicar outra ameaça descrita pelo americano: se antes o impacto econômico do envelhecimento da população em países desenvolvidos era mitigado pela chegada de mão de obra jovem estrangeira, o endurecimento de leis anti-imigração nos Estados Unidos e Europa apontam para uma bomba-relógio demográfica.

A grande ameaça do aquecimento global só agrava isso, argumenta Roubini. Com bilhões de pessoas em situação de risco por conta das mudanças climáticas, a tendência é que movimentos migratórios e conflitos internos só se intensifiquem nas próximas décadas.

Especialmente considerando que a fragmentação política impede uma cooperação global eficaz para impedir que as projeções mais catastróficas de aumento de temperatura se tornem realidade. Sem falar nos efeitos colaterais do desastre climático, como o surgimento de novas e mais letais pandemias.

Se movimentos migratórios em massa e o crescimento da desigualdade parecem inevitáveis, o avanço da inteligência artificial pode ser a gota d’água. Para o economista, se não for cuidadoso, essa tecnologia pode significar a extinção de milhões de postos de trabalho que não serão substituídos tão cedo.

Para o autor, os problemas se apresentam como “guerras” que o mundo precisará enfrentar na próxima década. Os governos vão precisar gastar fortunas para conter novos conflitos geopolíticos, a crise climática, pandemias e lidar com o rápido desenvolvimento tecnológico e a massa de pessoas destituídas surgida em seus rastros. Mas nem tudo está perdido.

“Nos últimos séculos, a tecnologia permitiu avanços econômicos que fizeram com que mesmo as pessoas em países mais pobres vivessem mais e com mais renda per capita”, argumentou o Roubini. Avanços na robótica, nas ciências da saúde e na agricultura podem ajudar a solucionar muitas das ameaças globais.

“A questão é se vamos sobreviver a essas mega-ameaças até que essas tecnologias nos levem a um lugar melhor”, sacramentou o economista.

O ciclo Fronteiras do Pensamento terá palestras de nomes como Anna Lembke e Simon Sebag Montefiore, e já contou com a participação de Stuart Russell, Muriel Barbery e Yascha Mounk.

Folha de São Paulo

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