Saúde

Pesquisa brasileira aponta novos alvos terapêuticos para fibrilação atrial

Uma nova pesquisa, publicada na Nature Cardiovascular Research, apontou novos alvos terapêuticos para a fibrilação atrial, condição que altera o ritmo do coração e pode ter, entre as principais complicações, AVC (acidente vascular cerebral) e demência. O estudo foi conduzido pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) em parceria com o Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR).

A fibrilação atrial é a arritmia cardíaca mais comum em nível global, atingindo cerca de 10% da população com mais de 80 anos. Estudos apontam que essa doença afeta mais de 30 milhões de pessoas ao redor do mundo, contribuindo significativamente para o aumento dos custos com saúde. Ela está associada a problemas como infarto e insuficiência cardíaca e, diante do envelhecimento da população, descobrir possíveis tratamentos tornou-se uma questão essencial para a saúde pública.

“A fibrilação atrial tem um custo enorme para a saúde pública, um custo não só social e pessoal, mas também econômico”, afirma Oscar Moreno, médico e um dos autores do estudo, que teve financiamento do CNPq e da Faperj.

A condição favorece a formação de trombos dentro do coração, que são pequenos coágulos sanguíneos capazes de viajar pelo sistema circulatório e atingir o cérebro, causando AVC.

“O coração, quando tem essa doença, fica como se fosse uma gelatina; ele fica tremendo, em vez de contrair e relaxar”, explica Emiliano Medei, pesquisador do IDOR e da UFRJ, do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, que liderou o estudo.

Essa é uma condição crônica, ou seja, acompanha o paciente por um longo período da vida, e as alternativas terapêuticas ainda apresentam limitações. Os principais tratamentos envolvem medicamentos anticoagulantes e antiarrítmicos, além de procedimentos como a ablação cardíaca.

“É uma doença muito comum, mas que tem apenas algumas opções de controle e nenhum tratamento propriamente dito”, diz Moreno que, nos últimos anos, pesquisa o papel do sistema imunológico na fisiopatologia das arritmias cardíacas.

Com o estudo recém-publicado, pode surgir uma nova perspectiva de tratamento. Os pesquisadores demonstraram que o sistema imunológico, além de seu papel de defesa, também interage diretamente com o coração por meio da liberação de diferentes substâncias. Uma delas, chamada interleucina 1 beta, regula processos inflamatórios e pode ser liberada por determinadas células do sistema imunológico, contribuindo para o desenvolvimento da fibrilação atrial.

A molécula interleucina 1 beta está presente na maioria dos estados inflamatórios. “Pacientes com gota, pacientes com hipertensão arterial, até pacientes que acabaram de ser submetidos a uma cirurgia, ou que tiveram um trauma e que não tinham nenhum problema no coração, simplesmente por ter essa elevação desse marcador inflamatório, tinha maior risco de desenvolver fibrilação arterial”, afirma Moreno.

“Conseguimos desvendar o mecanismo pelo qual ela pode causar a fibrilação atrial. Observamos que essa molécula age sobre células específicas chamadas macrófagos cardíacos, modificando tanto a estrutura quanto a função elétrica do órgão”, detalha o pesquisador.

Essas descobertas apontam para um novo alvo terapêutico que pode ser explorado no desenvolvimento de medicamentos para tratar essa doença. Além disso, os resultados reforçam as conexões entre o sistema imunológico e o coração. “É muito importante aprofundarmos nossos conhecimentos para melhorar o diagnóstico, o tratamento e o acompanhamento dos pacientes com essa doença no Brasil”, diz Medei.

O estudo foi realizado com uma amostra de 92 pacientes, nos quais os pesquisadores caracterizaram as alterações associadas à fibrilação atrial. Em seguida, levaram essas observações para o laboratório, onde elas serviram de base para investigações com modelos animais, utilizando camundongos. “Utilizamos abordagens que integram biologia, física e matemática para realizar as análises”, afirma Moreno.

A pesquisa foi publicada na Nature, uma das revistas acadêmicas mais prestigiadas da ciência. Segundo Oscar, o estudo posiciona a ciência brasileira de forma privilegiada. “Demonstra que podemos fazer ciência no Brasil e alcançar publicações de alto impacto, com grande repercussão na comunidade científica internacional.”

Informação

Folha de São Paulo

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