PrEP previne a infecção por HIV e tem no SUS – 16/08/2024 – X de Sexo Por Bruna Maia
São Paulo
Michelle, 38 anos, excelente esposa amantíssima que só faz sexo no seio do casamento, descobriu que Aloísio, 29 anos, filho gay do seu vizinho, pega medicamentos para prevenção da contaminação por HIV no posto de saúde.
Ele também faz exames, toma vacinas, pega camisinhas, lubrificantes. Um absurdo, diz Michelle, que ela, tão correta, tenha de pagar pela “promiscuidade” daquele rapazote. É que ela não sabe que seu marido, Gerson, 43, está trepando com ele, mas pelo menos Aloísio tem a decência de se cuidar e protegê-la, já que Gerson não tem muita consideração, né?
Fazendo minha parte para que Michelles e Gersons deixem de ser tacanhos, e Aloísios se tornem um exemplo, conversei com o médico infectologista Ricardo Kores sobre a PrEP, uma das ferramentas de prevenção do HIV, vírus causador da Aids, que está constantemente sob ataque dos conservadores.
A PrEP é um comprimido que contém dois medicamentos antirretrovirais: tenofovir e entricitabina. Sua eficácia é de cerca de 90%. Usada diariamente, ela impede o vírus HIV de se multiplicar caso o usuário tenha contato com ele. “Para ter acesso à medicação, a pessoa precisa passar por uma avaliação com um profissional de saúde como médico, enfermeiro e farmacêutico. Está disponível tanto na rede de saúde pública quanto privada”, diz Kores.
E, sim, mulheres podem tomar PrEP. Dia desses eu mesma fui no posto de saúde para uma consulta com o médico da família, perguntei sobre o medicamento e ele disse que se eu quisesse ele me prescreveria. Voltarei lá em breve para começar o tratamento!
A questão é que homens que fazem sexo com homens (HSH) foram historicamente priorizados nos estudos e pesquisas sobre isso por serem o grupo onde ocorria a maior taxa de transmissão do vírus. “Os primeiros estudos foram feitos com essa população, que tinha mais necessidade. Há menos estudos sobre o uso de PrEP em mulheres, mas os que existem apontam que elas podem usar com segurança”.
Há evidências de que a PrEP funciona em HSH se usada sob demanda –horas antes e horas depois de relação sexual de risco. Para mulheres, contudo, o uso tem que ser diário. Uma nova versão injetável do remédio, aplicada em intervalos de dois a seis meses e extremamente eficaz, já está em uso em alguns países e foi autorizada pela Anvisa para uso no Brasil. “Não temos previsão de chegada no SUS, mas esperamos que seja em breve”.
Detratores da PrEP acham que ela é diretamente responsável pela transmissão de outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) como sífilis, gonorreia, clamídia e HPV. A lógica é que ela estimularia os usuários a abandonarem o uso do preservativo, espalhando as outras infecções das quais ela não protege. “A PrEP é uma estratégia de prevenção adicional, deve ser usada com preservativo. Mas muitas pessoas que não usam camisinha vão continuar não usando, e o medicamento funciona como redução de danos”.
Além disso, usuários de PrEP tomam todas as vacinas disponíveis e fazem testagem para ISTs em intervalos curtos, o que facilita o diagnóstico e tratamento rápido. Quando foi a última vez que você, Marcelo, 33 anos, surfista, que odeia usar camisinha porque aperta o pau, se testou para sífilis? Ah! Você nem sabe o que é sífilis, né?
Ah, e se você homem ou mulher heterossexual acha que a PrEP é só para “viado” e gente promíscua, saiba que a expressão “homens que fazem sexo com homens” inclui tanto homossexuais quanto bissexuais e outras orientações. Inclui, também, os Gersons que ostentam heterossexualidade todo domingo no culto.
Quem pensa que o SUS não deveria oferecer o tratamento de prevenção para “gente que gosta de sair transando por aí” está sendo tacanho. Ao oferecê-lo para essas pessoas, todas as que transam com elas e que transam com quem transa com elas são protegidas como consequência.
Viva a PrEP e viva o SUS. Vá até o posto de saúde, tome vacinas, faça exames e converse com o médico para ver se esse medicamento é bom para você!
Informação
Folha de São Paulo