Sabesp informa grandes consumidores de água que vai cortar descontos na tarifa
A Sabesp vem notificando indústrias e clientes corporativos de que vai rescindir contratos que hoje preveem descontos na tarifa. O benefício, que valia para grandes consumidores de água, vai ser cortado a partir de 2025.
Segundo a companhia, a medida busca garantir a isonomia e a sustentabilidade dos serviços, para adequar a operação aos critérios pós-privatização.
Os chamados contratos de demanda firme ofereciam descontos na tarifa de água e saneamento para grandes clientes comerciais, com consumo mínimo de 100 metros cúbicos mensais. Embora haja cláusula prevendo a rescisão unilateral, empresas reclamam que foram notificadas sem maiores explicações e antecipam um impacto financeiro de até 200% na conta.
Questionada, a Sabesp não informou quantos clientes se enquadram nesse modelo.
Os anúncios de encerramento dos contratos —antecipados pelo jornal Valor Econômico— começaram a ser enviados no fim de outubro.
A Folha teve acesso a uma das notificações. Nela a Sabesp informa a rescisão em dois parágrafos, destacando que, após o prazo de 60 dias, o contrato será encerrado e passará a valer a tarifa vigente para a classe de consumo do imóvel.
O modelo padrão dos contratos em vigor foi feito pela Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo), que definiu os parâmetros e regras de adesão.
“O consumidor nunca teve oportunidade de discutir essa cláusula [de rompimento unilateral] e simplesmente aderiu a esse contrato porque, se não fosse dessa forma, não teria o benefício”, afirma Lucas Souza, CEO da We Save, consultoria que ajuda clientes a reduzir valor das contas de água e esgoto.
Atualmente, a precificação com os descontos varia por faixas de consumo. Quem consome de 500 a 1.000 metros cúbicos por mês, por exemplo, paga um valor de tarifa. Outro preço é cobrado de clientes que usam entre 1.000 e 3.000 m³, e assim por diante. Segundo Souza, os valores exatos não são divulgados pela agência reguladora, o que não permite saber o valor médio dos descontos.
“O que conseguimos dizer é a proporção do aumento [dos custos]. Com a rescisão, as contas devem ter um aumento entre 60% a até 200%”, diz. “Estamos falando de uma cadeia produtiva significativa. Hospitais, indústrias, supermercados, hotéis, shoppings, todos esses setores estão sendo afetados por essa medida totalmente abrupta da Sabesp”, acrescenta.
Em nota, a empresa de saneamento disse que o encerramento dos contratos busca garantir isonomia, sustentabilidade e transparência na prestação de serviços, alinhando-se ao novo acordo de concessão que prevê a universalização até 2029, incluindo a oferta de serviços a moradores de áreas rurais e comunidades vulneráveis que atualmente não são atendidos.
“A rescisão, que está prevista nos contratos, foi realizada de acordo com as normas, tendo avisos formais aos clientes. A Sabesp dispõe ainda de uma equipe para esclarecer dúvidas e oferecer suporte”, afirmou a companhia.
Procurada, a Arsesp disse que estabelece diretrizes gerais e normativas para assegurar a transparência e o equilíbrio econômico-financeiro dos serviços públicos de abastecimento de água, mas não define condições específicas ou a obrigatoriedade de contratação com grandes usuários.
“Essas decisões são de natureza comercial e ficam a cargo da concessionária”, afirmou. “A agência foi notificada pela concessionária sobre o rompimento e tem orientado os consumidores sobre os direitos e deveres relativos às normas contratuais e regulatórias.”
Souza diz que o encerramento dos contratos esbarra numa questão delicada, que passa pela previsibilidade jurídica para investidores e pelo impacto no balanço das companhias.
Diferentemente do mercado livre de energia, em que há uma pluralidade de fornecedores, o mercado de saneamento é um monopólio natural e o grande consumidor só consegue comprar água da Sabesp.
“Nós atendemos de médias a grandes empresas, e 99,9% já estavam com o planejamento financeiro de 2025 pronto quando receberam a carta da Sabesp, onde estava contemplada a tarifa que tinham no contrato”, afirma.
Segundo ele, a We Save atende cerca de cem empresas, sendo que todas receberam a notificação. Uma parte considera acionar a Justiça pela perspectiva do Código de Defesa do Consumidor.
Outro caminho cogitado pelas empresas afetadas, afirma Souza, é buscar fontes de abastecimento alternativas —como perfuração de poços artesianos— e o reúso de água.
Folha de São Paulo