Twitter sai do Brasil e o Grok explica a razão
O estatístico Nate Silver ficou famoso quando conseguiu prever o resultado das eleições de 2008 e 2012 nos EUA com uma precisão surpreendente. Na semana passada ele lançou seu novo livro: “On The Edge – A Arte de Arriscar Tudo”. Sua tese é que a economia global está se tornando um grande “bet” planetário.
Se antes a riqueza pertencia aos conglomerados industriais, hoje ela não mais se conecta com um setor produtivo. A acumulação pertence a quem opera riscos. Em outras palavras, o que antes entendíamos como investimento, agora tornou-se simplesmente aposta. Nas palavras dele, a economia atual é “um cassino: gamificada, comodificada, quantificada, monitorada e manipulada”.
Em outras palavras, o futuro pertence aos apostadores. Indivíduos ou empresas que estão em posição de assumir riscos monumentais. Se a aposta dá certo, os retornos são também monumentais. Se dá errado, perdem tudo.
O maior exemplo e protagonista dessa economia convertida em “bets” é o atual dono do X (ex-Twitter). Musk tem uma riqueza acumulada de US$ 250 bilhões (R$ 1,37 bi). Essa rede de segurança permite que ele faça apostas aparentemente incompreensíveis. Só que na medida em que essa economia-cassino vai se consolidando, suas ações se tornam não só justificáveis como também cheias de sentido.
A própria compra do Twitter é um exemplo. Musk adquiriu a plataforma por um montante muito acima do seu valor de mercado. Desde a compra, há um declínio constante de anunciantes e de receita. Mas nada disso importa. Sua aposta é mais complexa e de longo prazo. O Twitter foi só um trampolim para dominar uma parcela da esfera pública global, objetivo que foi cumprido com louvor.
A verdadeira grande aposta de Musk é política. Trata-se do apoio incondicional que ele deu ao candidato do partido republicano nos EUA. Tal como o Twitter, Musk apoiou Trump também no pico. Pouco tempo depois de receber seu apoio, o candidato que estava no topo das pesquisas começou a perder território nelas.
A aposta de Musk em Trump faz todo sentido. A Tesla vem prometendo aos investidores que seus carros se tornarão autônomos, capazes de autodireção. Era para essa tecnologia estar disponível já em 2020, e depois em 2024. Isso mudaria a vida nas cidades. Criaria uma rede global de “robô-táxis”, solapando de uma vez só todo o mercado dos táxis e dos aplicativos de transporte. A promessa nunca foi entregue e nem parece que será.
Além disso, a Tesla tem hoje inúmeros competidores em veículos elétricos. O que inclui fabricantes chineses, que fazem veículos equivalentes com preços muito menores. O resultado é uma pressão negativa enorme sobre as ações da empresa. É nesse contexto que a aliança com Trump é o “bet” ideal. O poder executivo dos EUA tem condições de proteger a empresa contra essas ameaças e fazer avançar seus interesses estratégicos.
É nesse contexto que Musk lançou o Grok, sua ferramenta de inteligência artificial. Sua principal característica é a capacidade de criar textos e imagens politicamente incorretos e sem freios. O que é perfeito para atacar adversários e gerar campanhas de desinformação.
Por exemplo, perguntei ao Grok porque o Twitter resolveu fechar seu escritório no Brasil. Ele me respondeu com um sincericídio:
“O X decidiu fazer uma saída dramática do Brasil e a razão é a telenovela onde o vilão é Alexandre de Moraes. O X é um adolescente rebelde tentando provar um ponto e decidiu que em vez de cumprir ordens, fecharia o escritório. Claro que isso não significa que o X deixará de funcionar no Brasil. Ele apenas tirou seu escritório do mapa, como se fosse um jogo de estratégia onde você decide não mais defender aquele território. É um clássico caso de “quem manda aqui sou eu, eu levo a minha bola e vou embora”. Mas, claro, o X continua disponível, porque, afinal, quem precisa de um escritório físico quando você tem a internet?”
Alea jacta est.
Já era – inteligências artificiais que ambicionam ser boazinhas e úteis
Já é – inteligências artificiais cuja principal função é a ironia e o ataque
Já vem – acirramento da disputa entre o X e o Supremo
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Folha de São Paulo>